Diário De Um Detento
Racionais Mc'S
7:3160% dos jovens de periferia sem antecedentes criminais já sofreram violência policial A cada quatro pessoas mortas pela policia, três são negras Nas universidades brasileiras, apenas 2% dos alunos são negros A cada quatro horas, um jovem negro morre violentamente em São Paulo Aqui quem fala é Primo Preto, mais um sobrevivente Minha intenção é ruim, esvazia o lugar Eu 'to em cima, eu 'to afim, um, dois, pra atirar Eu sou bem pior do que você 'tá vendo O preto aqui não tem dó, é 100% veneno A primeira faz bum, a segunda faz tah Eu tenho uma missão e não vou parar Meu estilo eh pesado e faz tremer o chão Minha palavra vale um tiro, eu tenho muita munição Na queda ou na ascensão, minha atitude vai além E tenho disposição pro mal e pro bem Talvez eu seja um sádico ou um anjo, um mágico Juiz ou réu, um bandido do céu Malandro ou otário, padre sanguinário Franco-atirador se for necessário Revolucionário, insano ou marginal Antigo e moderno, imortal Fronteira do Céu com o Inferno astral Imprevisível, como um ataque cardíaco do verso Violentamente pacífico, verídico Vim pra sabotar seu raciocínio Vim pra abalar seu sistema nervoso e sanguíneo Pra mim ainda eh pouco, Brown cachorro louco Número um, guia, terrorista da periferia Unidunitê, o que eu tenho pra você Um rap venenoso ou uma rajada de PT E a profecia se fez como previsto (1997) depois de Cristo A fúria negra ressuscita outra vez Racionais, capitulo quatro, versículo três (Aleluia) ahn (Aleluia) (Racionais, no ar filho da puta, pah, pah, pah) Faz frio em São Paulo, pra mim 'tá sempre bom Eu 'to na rua de bombeta e moletom Dim dim dom, rap é o som que emana no Opala marrom E aí? Chama o Guilherme, chama o Vânio, chama o Dinho E o Gui, Marquinho, chama o Éder, vamo' aí Se os outros mano' vem pela ordem, tudo bem melhor Quem é quem no bilhar, no dominó Colou dois mano', um acenou pra mim De jaco de cetim, de tênis, calça jeans Ei, Brown, sai fora, nem vai, nem cola Não vale a pena dar ideia nesse tipo aí Ontem à noite, eu vi na beira do asfalto Tragando a morte, soprando a vida pro alto Ó os cara', só o pó, pele e osso No fundo do poço, uma pá de flagrante no bolso Veja bem, ninguém é mais que ninguém Veja bem, veja bem, e eles são nossos irmãos também Mas de cocaína e crack, whisky e conhaque Os mano' morre rapidinho sem lugar de destaque Mas quem sou eu pra falar de quem cheira ou quem fuma? Nem dá, nunca te dei porra nenhuma Você fuma o que vem, entope o nariz Bebe tudo que vê, faça o diabo feliz Você vai terminar tipo o outro mano lá Que era um preto tipo A, ninguém entrava numa Mó estilo, de calça Calvin Klein, tênis Puma, é O jeito humilde de ser, no trampo e no rolê Curtia um funk, jogava uma bola Buscava a preta dele no portão da escola Exemplo pra nós, mó moral, mó Ibope Mas começou a colar com os branquinho' do shopping (aí já era) Ih, mano, outra vida, outro pique Só mina de elite, balada, vários drinque' Puta de butique, toda aquela porra Sexo sem limite, Sodoma e Gomorra Ahn, faz uns nove anos Tem uns quinze dias atrás, eu vi o mano, 'cê tem q ver Pedindo cigarro po's tiozinhos no ponto Dente tudo zoado, bolso sem nenhum conto O cara cheira mal, as tia' sente medo Muito louco de sei lá o quê logo cedo Agora não oferece mais perigo Viciado, doente e fodido, inofensivo Um dia um PM negro veio embaçar E disse pra eu me pôr no meu lugar Eu vejo um mano nessas condições, não dá Será assim que eu deveria estar? Irmão, o demônio fode tudo ao seu redor Pelo rádio, jornal, revista e outdoor Te oferece dinheiro, conversa com calma Contamina seu caráter, rouba sua alma Depois te joga na merda sozinho, é Transforma um preto tipo A num neguinho Minha palavra alivia sua dor, ilumina minha alma Louvado seja o meu Senhor Que não deixa o mano aqui desandar, hah E nem senta o dedo em nenhum pilantra Mas que nenhum filha da puta ignore a minha lei Racionais, capítulo 4 versículo 3 (Aleluia) (Aleluia) (Racionais, no ar filho da puta, pah pah pah) Quatro minutos se passaram e ninguém viu O monstro que nasceu em algum lugar do Brasil Talvez o mano que trampa debaixo do carro sujo de óleo Que enquadra o carro forte na febre com o sangue nos olhos O mano que entrega envelope o dia inteiro no sol Ou o que vende chocolate de farol em farol Talvez o cara que defende o pobre no tribunal Ou o que procura vida nova na condicional Alguém no quarto de madeira Lendo à luz de vela Ouvindo o radio velho no fundo de uma cela, ou Da família real e negro como eu sou Um príncipe guerreiro que defende o gol E eu não mudo, mas eu não me iludo Os mano cu de burro, tem, eu sei de tudo Em troca de dinheiro e um carro bom Tem mano que rebola e usa até batom Vários patrícios falam merda pra todo mundo rir Haha, pra ver branquinho aplaudir É, na sua área tem fulano até pior Cada um, cada um, você se sente só Tem mano que te aponta uma pistola e fala sério Explode sua cara por um toca-fita velho Click, plau plau plau, e acabou Sem dó e sem dor, foda-se sua cor Limpa o sangue com a camisa e manda se foder Você sabe por quê, pra onde vai, pra quem vai De bar em bar, de esquina em esquina Pegar cinquenta conto', trocar por cocaína Enfim, o filme acabou pra você A bala não é de festim, aqui não tem dublê Para os mano' da Baixada Fluminense à Ceilândia Eu sei, as ruas não são como a Disneylândia De Guaianases ao extremo sul de Santo Amaro Ser um preto tipo A custa caro, é foda Foda é assistir a propaganda e ver Não dá pra ter aquilo pra você Playboy forgado de brinco, o trouxa Roubado dentro do carro na Avenida Rebouça' Correntinha das moça', as madame' de bolsa, dinheiro Não tive pai, não sou herdeiro Se eu fosse aquele cara que se humilha no sinal Por menos de um real, minha chance era pouca Mas se eu fosse aquele moleque de toca Que engatilha e enfia o cano dentro da sua boca De quebrada, sem roupa, você e sua mina Um, dois, nem me viu, já sumi na neblina Mas não, permaneço vivo, não sigo a mística Vinte e sete ano' contrariando a estatística Seu comercial de TV não me engana, ahn Eu não preciso de status nem fama Seu carro e sua grana já não me seduz E nem a sua puta de olhos azuis Eu sou apenas um rapaz latino-americano Apoiado por mais de cinquenta mil manos Efeito colateral que o seu sistema fez Racionais, Capítulo 4 Versículo 3